O dia foi ter saído caminhar com o cachorro às 9h da manhã e se permitir comer algumas amoras no pé. Aquilo de tingir as pontas dos dedos de roxo a deixara feliz. Estava em jejum e se sentia imensamente realizada por inaugurar o dia com amoras. Colocava-se nas pontinhas do pé para alcançar a mais doce, cuidando para não deixar que nenhuma borrasse o chão. Afinal o dia era, porque amoras.
* * *
O dia quase não foi. Chovia. As amoras maduras pingaram no chão. Sangrou roxo o dia. O cachorro nem sequer saiu da casinha. E quando tudo quase já não era, a mãe percebeu a sua aflição: é preciso ter um bolo em dias de chuva. Ufa, o bolo! Ficou leve ao ver a clara se transformar em neve. O bolo dentro do forno crescia. Estufava o peito. Afinal o dia era, porque bolo de chuva.
* * *
O dia foi adiado para começar mais tarde. Não havia fato para arrancar-lhe da cama. O bolo já servido no café da manhã. As amoras se sendo sem sua atenção. Foi trabalhar. Voltou para a casa sem o dia estrear. De pijama, ainda procurou um fato. Pensou em escrever uma carta ou arrumar a cozinha para a mãe (usaria até bombril para ariar as panelas). Não se encontrou e foi dormir antes do dia acontecer.
Afinal muitos dias são, porque amanhã.
3 comentários:
tão melancólico como Edward Hopper... as amoras são assim mesmo...tingem... marcam...
adorei
Hoje faria um bolo de chuva pra você. Amo.
Lindo Ju.
no casulo e em queda livre vc faz despertar!
aqui longe nao tem amora...mas tem mta saudade da cor dela.
Postar um comentário